5 de dez. de 2010

Resenhando: Depeche Mode, Leoni, INXS, Maria Bethânia, Paul McCartney & Wings

“Tour of the universe: Barcelona 20/21.11.09”– Depeche Mode
O Depeche Mode é uma das bandas que mais dá valor aos registros áudio-visuais de suas turnês. E o faz com razão. Entra turnê, sai turnê, os shows da banda de Martin Gore, Dave Gahan e Andrew Fletcher são sempre bem interessantes – pena que eles nunca venham ao Brasil. Ao invés de se acomodar (como acontece com a maioria das bandas), o Depeche Mode sempre prepara roteiros bem diferentes entre uma turnê e outra, bem ao espírito do grupo. Se na “Exciter tour” (2001), a banda destilava depressão, logo depois, em “Touring the Angel” (2005/2006), o Depeche Mode fazia um dos shows mais coloridos e alegres de sua carreira. O novo DVD (também em CD e BD) “Tour of the universe: Barcelona 21/21.11.09” flagra a banda na turnê de divulgação de seu último (e excelente) álbum de estúdio, “Sounds of the universe” (2009). Turnê que, diga-se, não começou nada bem, com diversos shows adiados por conta de um tumor (felizmente extirpado) na bexiga de Gahan. O DVD traz um show do final da turnê – antes, a banda já tinha rodado boa parte da Europa e dos Estados Unidos. E é aí que reside o problema. Apesar de mostrar uma banda absolutamente à vontade, o vídeo apresenta um repertório muito parecido com a turnê anterior, “Touring the angel” (2006), algo incomum na videografia da banda inglesa. No início da turnê, o Depeche Mode apresentava músicas que, havia tempos, não integrava o roteiro de suas apresentações, como “Master and servant” e “Strangelove”. No decorrer da turnê, essas músicas foram substituídas por outras mais comuns, como “Behind the wheel” e “World in my eyes”. Pena. De qualquer maneira, é sempre bom ouvir a banda interpretar clássicos como “Never let me down again”, “Enjoy the silence”, “Walking in my shoes” e “It’s no good”. E isso sem contar com as boas músicas de “Sounds of the universe”, ainda que uma de suas melhores, “Peace”, também tenha ficado pelo meio do caminho (e, assim, fora do DVD) no decorrer da turnê.

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“A noite perfeita – Ao vivo” – Leoni
Se a gente vivesse na Inglaterra, Leoni seria milionário como um Elton John. Um dos melhores compositores da geração 80 do rock brasileiro, Leoni mostra em seu novo trabalho, “A noite perfeita – Ao vivo”, que continua o mesmo excelente compositor dos tempos do Kid Abelha e do Heróis da Resistência. Poucos artistas conseguem, como Leoni, apresentar um álbum cheio de canções inéditas que, à primeira ouvida, grudam na cabeça. Apesar de ser um trabalho ao vivo, o CD é composto majoritariamente por novas músicas – já o DVD traz sucessos muito bem-vindos, como “Temporada das flores”, “Por que não eu?”, “Exagerado”, “Fórmula do amor”, “Educação sentimental” e “Garotos II”, além de lados B, como “Um herói que mata” (do tempo dos Heróis da Resistência) e “Quem além de você” (do álbum “Outro futuro”, de 2006). Das inéditas, destacam-se a roqueira “Dá pra rir e dá pra chorar” (parceria com Beni Borja), a balada pop “Do teu lado” (com os versos “Canção pra andar do teu lado / Em toda e qualquer cidade / Pra te cobrir de sorrisos / Quando eu chorar de saudade” escritos a quatro mãos com o compositor Rodrigo Maranhão) e “Hora de pular do trem” (com Luciana Fregolente). A faixa-título, a melhor do álbum (e uma das mais deliciosas canções de Leoni), escrita com George Israel, já havia sido lançada pelo parceiro. O show “A noite perfeita” já vem rodando o país desde o final de 2008. Pelo visto, chegou ao CD/DVD na hora certa. O público de Leoni já sabe cantar as inéditas de cor, e a banda Furacão de Bolso, formada por Gustavo Corsi (guitarra), Andrea Spada (baixo) e Lourenço Monteiro (bateria), está super azeitada. Leoni honra a sua geração.

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“Mystify” – INXS
Os mais novos talvez duvidem, mas o INXS já foi uma banda “mega”. Michael Hutchence e seus colegas tiveram pelo menos dois álbum multiplatinados (“Kick, de 1987, e “X”, de 1990), gravaram um vídeo (“Live baby live”, já lançado em DVD) em um estádio de Wembley mais entupido do que privada de posto de gasolina de estrada, e foram headliners de uma noite da segunda edição do Rock in Rio, que aconteceu no Maracanã. Mas se você não tem ideia de nada disso, e ainda colocar para rodar “Mystify”, novo DVD da banda, pode achar que o INXS poderia nem ter existido. Filmado no dia 21 de junho de 1997, no Loreley Festival (Alemanha), durante a turnê de divulgação do álbum “Elegantly wasted” (97), o vídeo traz uma banda fria, apática e sem a mínima graça. Parece que os integrantes da banda envelheceram 40 anos após o “Live baby live”, registrado em 1991. É impressionante a falta de tesão e a burocracia com a qual músicas arrasa-quarteirão como “New sensation”, “Suicide blonde” “Devil inside” e “Whay you need” são executadas. O público alemão não é lá, vai lá, um dos mais animados, mas o seu comportamento nesse show é de causar bocejos dignos de um porre de dry Martini simultâneo a uma ópera de Pergolesi. As músicas que ora estavam sendo lançadas, então, poderiam render uma palestra do tipo “do estrelato ao depauperamento em três passos”. Michael Hutchence partiu dessa pra melhor quatro meses após o show. Algo estranho já rolava no ar. E, caso você não queria sentir, fique com o show bônus, filmado em maio de 1984. São seis músicas mostrando o INXS na flor da idade. E como a banda era boa, viu? “Original sin”, “Don’t change”, “The one thing”... A dúvida é inevitável: com Michael Hutchence vivo, onde estaria o INXS hoje? Seria um U2 ou um Simple Minds?

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“Amor festa devoção” – Maria Bethânia
Fazendo uma comparação grosseira (e com base no que escrevi na resenha do “Tour of the universe”, acima), a Maria Bethânia é uma espécie de Depeche Mode brasileira na hora de lançar DVDs. A uma, porque, nos últimos tempos, não tem um show da “Abelha-rainha” que não saia em vídeo; a duas, porque os repertórios de seus DVDs são absolutamente diferentes entre si. E, ao contrário do Depeche Mode, Maria Bethânia surpreendeu com “Amor festa devoção”, DVD, dirigido por André Horta e Lizanne Paulo, que traz o registro do show de lançamento dos álbuns “Tua” e “Encanteria”, ambos lançados em 2009. No roteiro da apresentação, Bethânia privilegiou as canções desses dois discos, misturando-as com coisas mais antigas, como “Vida” (Chico Buarque), o texto “Olho de lince” (escrito por Waly Salomão, e com aquele célebre verso “quem fala de mim tem paixão”), “É o amor” (Zezé di Camargo) e “Reconvexo” (Caetano Veloso). A propósito, esses foram os únicos grandes sucessos do roteiro que o público cantou junto. Ah, tudo bem, a cantora baiana interpretou “Não dá mais pra segurar (Explode coração)” e “O que é, o que é” (ambas de Gonzaguinha), mas em versões rápidas e a capella, como se quisesse mandar o recado de que elas estavam lá porque cabiam no roteiro, e não como frutos de apelação. Bethânia retorna ao seu show “Rosa dos ventos” (1971) para relembrar “Não identificado” (um dos momentos mais aplaudidos da nova turnê, e que foi dedicado a mãe), e ainda permanece com o mano Caetano em “Queixa”, inédita em sua voz, bem como o bolero “Dama do cassino”. Vale destacar também a lindíssima “Balada de Gisberta”, de Pedro Abrunhosa, com um arranjo grandioso de Jaime Alem. Tudo isso para mostrar que Bethânia, é verdade, não precisa apelar – e já precisou alguma vez? Assim como “Brasileirinho”, esse “Amor festa devoção” é um dos grandes shows de sua carreira. E o DVD está com um tratamento de áudio (mixado por Moogie Canazio), no mínimo, sensacional.

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“Band on the run” (Archive collection) – Paul McCartney & Wings
Dentre as infindáveis discussões travadas pelos alucinados por Beatles está uma sobre o melhor álbum solo dos integrantes da banda. Geralmente, metade fica com “All things must pass”, de George Harrison, e a outra metade, com “Band on the run”, do Paul McCartney & Wings. Pessoalmente, fico com o álbum do guitarrista, mas não dá para negar, jamais, o valor do álbum que Paul lançou em 1973. Gravado em Lagos, na Nigéria, “Band on the run” possui nove faixas, sendo sete clássicos absolutos: a faixa-título, “Jet”, “Bluebird”, “Mrs Vandebilt”, “Let me roll it”, “Nineteen hundred and eighty Five” e “Mamunia”. Com exceção da última, todas foram tocadas nos recentes shows no país. O CD bônus da edição especial que chegou às lojas (lá de fora) na semana retrasada, traz os singles “Helen Wheels” e “Country dreamer”, lançados na mesma época do disco, além de gravações ao vivo. Mas o melhor mesmo é o DVD, com 75 minutos de videoclipes, imagens raras em Lagos e a íntegra do programa “One hand clapping”, com várias versões ao vivo de faixas do álbum, além de outras, como “Live and let die”, “C moon” e “Soily”. A edição em vinil também é super recomendada aos audiófilos. Uma boa aula de como um álbum deve ser mixado para o vinil. Acho que nunca ouvi um som tão vivo na minha vida. Sério. Nos próximos meses, Paul McCartney lançará as edições especiais de “McCartney” (1970), “McCartney II” (1971), “RAM” (1971), “Venus and Mars” (1975), “Wings at the speed of sound” (1976) e “Wings over America” (1977). Hum, bem que esse último poderia vir trazendo o DVD com o show na íntegra, né?

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Em seguida, “Enjoy the silence”, extraído do DVD/BD “Tour of the universe”, do Depeche Mode: