6 de set. de 2008

CD: “POETA, MOÇA E VIOLÃO” (VINICIUS, CLARA NUNES E TOQUINHO) – O NASCIMENTO DA MAIOR SAMBISTA DO BRASIL?

Lançado originalmente pela Collector’s, “Poeta, Moça e Violão”, álbum que apresenta um antológico show realizado por Vinicius de Moraes, Toquinho e Clara Nunes, está de volta às lojas. De início, vale ressaltar que há diferenças entre os dois produtos. A mais sensível de todas é o fato de o novo álbum, agora lançado pela Biscoito Fino, ter 22 músicas, enquanto o original tinha 31 em um vinil triplo. Todas as poesias declamadas por Vinicius, com exceção de “Poética” foram limadas, assim como algumas canções como “Tarde Em Itapuã”, “São Demais Os Perigos Desta Vida” e “Gente Humilde”.

Mas, mesmo assim, não há nada do que reclamar. Houve uma melhora no som, que, apesar de um pouco abafado, apresenta as vozes e instrumentos com bastante nitidez. De acordo com o release e o encarte do álbum, o compositor Paulo César Pinheiro (marido de Clara Nunes) cedeu as três fitas, com a gravação do espetáculo, que tinha em seu poder durante 35 anos. O trabalho de recuperação de áudio foi doloroso, sendo certo que foram necessários mais de uma dezena de aparelhos analógicos e digitais, bem como avançados programas de computador para que o disco pudesse ser lançado com uma qualidade razoável de som. A partir do que foi recuperado, o produtor José Milton desenvolveu um novo roteiro musical.

Mas o trabalho compensou. De todos os 19 discos gravados pela dupla Vinicius & Toquinho, “Poeta, Moça e Violão” pode figurar, facilmente, entre os melhores.

Contando um pouco a história do show, no início de 1973, a dupla se juntou a até então não muito conhecida Clara Nunes – o seu empresário era o mesmo de Vinicius & Toquinho – para rodar o Brasil e o exterior. A estréia aconteceu no Teatro Castro Alves, em Salvador, e algumas faixas do disco foram retiradas dessa apresentação; outras de um outro show na Boite Sucata, no Rio de Janeiro.

O repertório do álbum é irrepreensível e dispensa maiores comentários. Os principais parceiros de Vinicius de Moraes foram lembrados, até mesmo os que não são muito citados, como Antonio Maria (“Quando a Noite Me Entende”), Pixinguinha (“Lamento” e “Mundo Melhor”), Ary Barroso (“O Rancho das Namoradas”) e Paulinho Soledade (“Poema Dos Olhos Da Amada”). Outros dois grandes parceiros muito importantes na carreira de Vinicius também estão bem representados. Carlos Lyra comparece com “Marcha da Quarta-Feira de Cinzas”, enquanto Baden Powell ganha um medley que junta os seus principais afro-sambas, “Berimbau”, “Consolação” e “Canto de Ossanha”. E como não poderia deixar de ser, Antonio Carlos Jobim também tem o seu espaço, com clássicos da Música Popular Brasileira, como “A Felicidade”, “Garota de Ipanema” e “Se Todos Fosse Iguais a Você”.

Mas Vinicius estava mesmo era em verdadeira lua-de-mel com o seu parceiro Toquinho. As canções da dupla são várias no álbum: “Veja Você”, “Samba de Orly” (com Chico Buarque também), “Cotidiano Nº 2”, “Regra Três” e “Como Dizia o Poeta”. Engraçado notar que com apenas quatro anos de parceria, os dois compositores escreveram uma penca de clássicos que, até hoje, estão no imaginário popular... Uma das faixas (a única do CD não assinada por Vinicius) é de Toquinho com Paulo Vanzolini (“Na Boca da Noite”). E “Rancho das Flores” e “Serenata do Adeus” mostram que, Vinicius de Moraes podia ser tão bom compositor, quanto poeta.

Analisando “Poeta, Moça e Violão” em retrospectiva, a principal conclusão a que se pode chegar não é a de que foi apenas um grande show que gerou um grande disco. Clara Nunes iniciou a sua carreira como cantora, essencialmente, de samba-canção. Até o histórico show, ela havia gravado três álbuns (dois que levavam o seu nome, em 1971 e 73, e “Clara Clarice Clara”, de 72) apenas medianos e que não mostravam toda a sua capacidade e real força de expressão. Curiosamente - ou sintomaticamente –, em 1974 e 75, ela gravou os seus álbuns mais importantes, verdadeiros tratados do samba no Brasil: “Alvorecer” e “Claridade”, respectivamente. Seria apenas uma coincidência?

Abaixo, a faixa de encerramento do disco, “Se Todos Fossem Iguais a Você”.

Cotação: ****1/2

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