28 de set. de 2008

CD: “CAZUZA – BOX DISCOGRAFIA COMPLETA” (CAZUZA) – MUITO RELANÇAMENTO PARA NENHUMA NOVIDADE

É inegável que Cazuza é um dos artistas mais explorados com o lançamento de coletâneas e de novas edições de seus álbuns oficiais. Às vezes, acontece de a gravadora ter alguma boa vontade e lançar algo realmente inédito, como o CD com o show no Teatro Ipanema em 1987 (“O Poeta Está Vivo”), ou o DVD com os seus especiais para a Rede Globo (“Pra Sempre”). Muito pouco para um artista que tem uma legião de fãs e já se foi há tanto tempo.

Agora, se não lançou mais uma coletânea, a Universal colocou no mercado a caixa “Cazuza”, com os seus seis álbuns de estúdio, bem como o DVD “Pra Sempre”, lançado há apenas três meses. Em 1996, a gravadora já havia posto no mercado a caixa “Codinome Cazuza”, com os seus seis discos e mais um álbum com diversos artistas cantando composições de Cazuza, com direito a uma faixa inédita em disco (“Doralinda”) na voz do poeta carioca. A caixa logo saiu de catálogo, mas os álbuns de Cazuza podiam ser encontrados separadamente nas prateleiras das lojas.

O novo box, “Cazuza”, tem o mérito de reagrupar todos esses álbuns mais uma vez, e é válido para quem não comprou a caixa anterior, ou para os novos fãs de Cazuza. A qualidade da nova caixa também é superior. Os álbuns foram remasterizados e ficaram com um som muito mais potente, distantes do áudio “metálico” das edições anteriores. E as capas foram preservadas tal qual na época do lançamento dos discos em vinil. Ponto para os produtores do box.

Por sua vez, uma pergunta não quer calar: será que Cazuza não deixou nada de inédito nos arquivos da gravadora? Por exemplo, a extinta Rede Manchete filmou o show no Teatro Ipanema em 1987. Será que tal material não poderia ser lançado em DVD? (Certamente seria um bom acompanhamento para essa caixa...) E o show “Ideologia” que originou o disco “O Tempo Não Pára”? Será que as músicas que fizeram parte do roteiro do show e ficaram de fora do disco – ele tem apenas dez faixas – não foram gravadas?

De qualquer forma, o fã vai ter que se contentar com o que tem. E, levando-se em conta a obra de Cazuza, já é muita coisa.

“Cazuza” traz a discografia solo completa do compositor carioca (a fase do Barão Vermelho ficou de fora), do seu primeiro álbum, “Cazuza” (1985) até o póstumo “Por Aí” (1991), com sobras de estúdio do disco anterior, “Burguesia” (1989).

O primeiro disco, com várias músicas que entrariam no álbum que o Barão Vermelho lançou em 1986, possui uma pegada mais roqueira, com grandes músicas como “Exagerado”, “Medieval II” e “Rock da Descerebração”. Por outro lado, Cazuza já começa a apresentar a sua veia mais lírica, com canções mais lentas, no estilo de uma MPB mais tradicional, como “Codinome Beija-Flor”. O disco posterior, “Só se For a Dois” (1987), já mostra um Cazuza com um estilo realmente mais voltado para a MPB, com canções de amor embaladas em uma sonoridade mais lenta, como “Solidão Que Nada” e “Só Se For a Dois”. Esse disco também apresenta “O Nosso Amor a Gente Inventa (Estória Romântica)”, um dos maiores sucessos de sua curta carreira.

Logo após o lançamento desse álbum, Cazuza descobriu que era portador do vírus da Aids. E a sua resposta está em “Ideologia” (1988), no qual o cantor, como ele próprio afirmou na ocasião, parou de olhar um pouco para o seu umbigo e resolveu cantar as mazelas de seu país. Daí vieram verdadeiros tapas na cara do Brasil como “Ideologia” (“Meu partido / É um coração partido / E as ilusões estão todas perdidas / Os meus sonhos foram todos vendidos / Tão barato que eu nem acredito”) e “Brasil” (“Não me convidaram / Pra essa festa pobre / Que os homens armaram pra me convencer / A pagar sem ver / Toda essa droga / Que já vem malhada antes de eu nascer”). A veia lírica também estava a pleno vapor, em clássicos como “Um Trem Para as Estrelas”, “Minha Flor, Meu Bebê” e “Faz Parte do Meu Show”. E em “Boas Novas”, Cazuza dizia com naturalidade que viu “a cara da morte e ela estava viva”.

O álbum “Ideologia”, o melhor de sua discografia solo, deu origem a uma turnê, na qual foi gravado o seu disco seguinte, “O Tempo Não Pára”. Com novas interpretações para velhos sucessos (inclusive uma versão lenta para o rock dos tempos do Barão, “Todo Amor Que Houver Nessa Vida”), o disco se destaca por conta da bela versão para a música de Lobão, “Vida Louca Vida” (“Vida louca vida / Vida breve / Já que eu não posso te levar / Quero que você me leve”), e a inédita “O Tempo Não Pára”, talvez a sua melhor composição (“Te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro / Transformam o país inteiro num puteiro / Pois assim se ganha mais dinheiro”).

Já muito debilitado pela doença, Cazuza retornou ao estúdio em 1989, para gravar o seu testamento-musical “Burguesia”, com 20 canções, dentre as quais a faixa-título, “Perto do Fogo” (parceira com Rita Lee que, posteriormente, gravou a canção) e “Mulher Sem Razão”, que, recentemente, ganhou uma ótima versão de Adriana Calcanhotto. As canções estão aquém de sua produção, mas, mesmo assim, é emocionante ouvir Cazuza cantando coisas como “Porque o meu canto é que me mantém vivo”, verso de “Quando Eu Estiver Cantando”, gravado por Cazuza deitado no chão do estúdio devido à fraqueza ocasionada pelo vírus HIV.

Se “Burguesia” é parte menor na discografia de Cazuza, “Por Aí” não vai muito além, até mesmo por ser um disco com sobras de estúdio do álbum anterior. Mesmo assim, ainda há faixas interessantes como “Não Há Perdão Para o Chato”, “Hei Rei!” (que chegou a fazer relativo sucesso na época do lançamento do álbum) e “Por Aí...”. A curiosidade fica por conta da regravação de “Camila, Camila”, sucesso da banda Nenhum de Nós, e que conta com participação especial de Sandra de Sá.

Enfim, Cazuza nunca é demais. Isto é fato. Mas que a gravadora poderia ter caprichado mais nesse box, com a inclusão de material inédito, ah, isso poderia...

Cotação: ****

Nenhum comentário: