30 de jul. de 2008

CD: “UMA NOITE... NOEL ROSA” (VÁRIOS ARTISTAS) – SEM ARRISCAR, NOEL GANHA UM TRIBUTO APENAS BUROCRÁTICO

Sem muito alarde, no ano passado comemorou-se 70 anos da morte de Noel Rosa, compositor que dispensa maiores comentários. A efeméride passou praticamente despercebida, mas no apagar das luzes de 2007, alguns dos melhores artistas de nossa música prestaram um tributo ao poeta da Vila. E é exatamente esse show que é imortalizado agora no CD “Uma Noite... Noel Rosa”, lançado pelo selo MP,B Discos, com distribuição da Universal Music. O DVD chega às lojas dentro de algumas semanas.

“Uma Noite... Noel Rosa” é aquele tipo de projeto que não tem erro. As composições de Noel são algumas das mais emblemáticas da Música Popular Brasileira. E juntando um time de bons intérpretes, a coisa não tem como sair dos trilhos. Assim, a MP,B já tinha uma canastra na mão ao juntar as canções eternas de Noel a cantores como Zeca Pagodinho, Ney Matogrosso e Roberta Sá. Mas fato é que, em muitas vezes, o disco soa um pouco burocrático e frio. Parece que os produtores ficaram com receio de fazer algo que fugisse um pouco da normalidade.

Por exemplo, em 1992, o saudoso produtor Almir Chediak lançou o songbook de Noel Rosa – um dos melhores do gênero, diga-se de passagem. Naquele álbum-tributo, João Bosco gravou “Gago Apaixonado”. Adivinha qual canção João Bosco gravou para “Uma Noite... Noel Rosa”? Exatamente a mesma. No songbook de Chediak, João Nogueira gravou, com a costumeira maestria, “Conversa de Botequim”. Em “Uma Noite... Noel Rosa”, seu filho, Diogo Nogueira, com um timbre muito parecido ao do pai, gravou a mesma canção. Ney Matogrosso, em seu antológico disco “À Flor Da Pele” (em parceria com o violonista Raphael Rabello) gravou “Último Desejo” e “Três Apitos”. Exatamente as duas canções foram repetidas em “Uma Noite... Noel Rosa”.

Essa sensação de ‘déjà vu’ não tira o brilho do projeto dirigido por João Mário Linhares e Ricardo Moreira, mas é inegável que o ouvinte, após uma rápida escutada no CD, vai pensar que algo poderia ser realmente melhor.

O grande destaque do disco é a cantora Roberta Sá. Com o seu estilo brejeiro, as canções de Noel Rosa caem como uma luva à sua agradável voz. A sua versão para “Pela Décima Vez” é o grande momento do show, superando em muito a impostada interpretação de Bethânia no songbook lançado há 16 anos. Roberta Sá também brilha em “O X Do Problema” e “Silêncio de Um Minuto”, sempre acompanhada pela ótima banda Anjos Da Lua, que participou de todas as canções do show.

Zé Renato é outro que se sai bem no clássico “Com Que Roupa” e, melhor ainda, na pouco conhecida “Rapaz Folgado”. Já Rodrigo Maranhão, apesar de grande compositor, não tem voz para segurar um “Feitiço Da Vila”, que já foi imortalizada por tantos monstros de nossa música. O mesmo acontece em “Pra Que Mentir?”, que acaba se transformando no pior momento do álbum. Já em “Palpite Infeliz”, Zé Renato faz um dueto com Maranhão e acaba segurando a onda.

Ney Matogrosso, apesar de não arriscar em canções diferentes do repertório de Noel, faz de “Três Apitos” outro grande momento de “Uma Noite... Noel Rosa”. Diferentemente da gravação feita no “À Flor Da Pele”, aqui Ney optou por algo mais leve e simples, que fica ainda mais bonito com a ótima intervenção do acordeonista Marcelo Caldi. A gravação ganhou muito com um arranjo que ficou mais próximo do universo de Noel Rosa – mais popular e menos clássico.

O encerramento com “Adeus / O Orvalho Vem Caindo / Até Amanhã” é outra bola dentro. Nessas canções, os instrumentistas dos Anjos Da Lua soltam a voz e, com muita descontração, misturando samba com choro, finalizam o projeto de modo muito interessante.

Completando o álbum, além de João Bosco, Zeca Pagodinho também gravou uma faixa em estúdio. “Fita Amarela” é uma bela música de Noel e que ganha muito com a característica interpretação ‘malandra’ do sambista carioca. O único senão é que a participação de Zeca Pagodinho vai dar mais munição para os críticos que vêm dizendo – não sem razão – que o sambista está se transformando em arroz de festa, com tantas participações em projetos coletivos desse gênero.

Cotação: ***1/2

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