23 de jul. de 2008

CD: “THIRD” (PORTISHEAD) – INTRIGANTE É A SUA MELHOR DESCRIÇÃO

Quem ouviu o primeiro single de “Third” deve ter pensado que a gravadora do Portishead enlouqueceu. Com uma melodia extremamente anti-comercial (isso não é uma crítica) e repetitiva (isso não é um elogio), “Machine Gun”, se estivesse presente em um álbum de qualquer outra banda, jamais se transformaria em single. Mas com o Portishead, é outra história. Em sua essência, “Third” é como “Machine Gun”: difícil, desorientador, experimental, claustrofóbico, sombrio, cru, torturante e, acima de tudo, intrigante. Ou seja, se você espera por singles fáceis, melhor nem colocar “Third” para rodar.

A abertura em português (“Esteja alerta para a regra dos (sic) três. O que você dá, retornará para você. Essa lição você tem que aprender. Você só ganha o que você merece”) dá a impressão de ter sido retirada de algum programa de televisão – provavelmente daqueles religiosos que são transmitidos madrugada adentro. E essa é exatamente a sensação que “Third” passa. Cada faixa é uma faixa, assim como cada canal de televisão é um canal de televisão.

A conclusão parece óbvia e burra, mas não é. Assim como “Third” está longe de ser óbvio e burro. Isto porque, apesar de seus fãs considerarem o Portishead uma banda de trip-hop, as canções desse novo disco são tão diferentes entre si, que fica impossível classificar o que o Portishead faz hoje, depois de 11 anos sem lançar um álbum de estúdio.

A banda de Bristol fundada em 1991, e formada por Geoff Barrow (samples), Beth Gibbons (vocais) e Adrian Utley (guitarra), fez de seu terceiro disco de estúdio algo bem diferente de “Dummy”, o primeiro, lançado em 1994 e que foi puxado pelo single “Numb”. Do segundo álbum, que saiu em 1997, e que leva o mesmo nome da banda, também está bem distante.

Na verdade, “Third” representa uma viagem sem fim do Portishead, tudo bem diferente dos discos anteriores. Pelo jeito, a mentalidade dos integrantes do grupo mudou bastante nesse 11 anos... E o resultado é o trabalho menos acessível de sua discografia. Demanda uma atenção extrema do ouvinte, e o fato de ter chegado a segunda posição da parada de discos britânica chega a ser, de certa maneira, surpreendente.

Em entrevista ao site Pitchfork, em abril passado, Geoff Barrow disse: “Nós realmente queríamos soar como nós mesmos, mas sem soar como nós mesmos. E isso está ficando cada vez mais difícil”. Difícil compreender a mensagem, não? Então, prepare-se, porque em “Third”, as coisas ficam muito mais sombrias.

A faixa de abertura já mostra o porquê. “Silence” começa com um ‘loop’ de bateria repetitivo, até que guitarras distorcidas aparecem para deixar o negócio ainda mais complicado. E a sua neurótica letra (“Did you know when you lost? / Did you know when I wanted? / Did you know what I lost? / Did you know what I wanted?”) deixa o ouvinte ainda mais desorientado. Realmente é difícil se acostumar com esse novo trabalho da banda inglesa. “Hunter”, a faixa seguinte não fica longe da estranheza inicial, com as suas referências acústicas e os vocais flutuantes e hipnotizadores de Beth Gibbons, no melhor ‘estilo década de 50’.

“Nylon Smile”, uma espécie de ‘folk-árabe’, tem mais uma letra digna dos divãs de psicanálise: “I struggle with myself / Hoping I might change a little / Hoping that I might be / Someone I want to be”. Como se não bastasse, “Deep Water”, uma espécie de ode ao suicídio, com um minuto e meio de duração parece uma gravação dos anos 20, com a sua melodia calcada em um ukulelê.

“We Carry On” já tem mais a cara do Portishead, com a sua batida industrial e a forte levada no baixo. Talvez seja o melhor momento de “Third”. Já “Small”, com a sua melodia angelical, é uma canção que cresce ao longo de seus (longos) sete minutos de duração. A melancólica “Threads” tem um diferencial por conter os melhores vocais de Beth no disco inteiro. “The Rip”, com o seu andamento rítmico indecifrável e as suas guitarras cheias de eco, é uma espécie de síntese de “Third”.

Até agora fica difícil dizer se 11 anos longe dos estúdios fizeram bem ao trio inglês. Com a palavra, os fãs...

Cotação: ****

Abaixo, o videoclipe de “Machine Gun”.

2 comentários:

Anônimo disse...

Caramba! oO... sem palavras pra isso!!!!!!!!!

Unknown disse...

Parabéns pela análise bem feita!! O Third realmente surpreendeu a maior parte dos fãs, e comigo não foi diferente. Surpreendeu positivamente, claro!