14 de jun. de 2008

A OBRA CONTINUA EM PROGRESSO

Desde o dia 14 de maio, Caetano Veloso vem apresentando, todas as quartas-feiras no Vivo Rio, o seu show “Obra Em Progresso”, no qual mostra canções que estarão presentes em seu novo disco, bem como velhos sucessos. A cada quarta, o compositor baiano mostra um show diferente. Lógico que algumas canções (especialmente as inéditas) acabam se repetindo, mas o tema central acaba variando em cada apresentação.

No espetáculo da quarta-feira, dia 04, Caetano aproveitou o fato de Barack Obama ter sido escolhido candidato do partido democrata para as próximas eleições norte-americanas, para falar bastante de um tema bem espinhoso: o racismo. O início do show com “Sugar Cane Fields Forever” foi a deixa, com os seus versos repetidos à exaustão: “Sou um mulato nato / No sentido lato / Mulato democrático do litoral”. No decorrer da canção, Caetano discorreu longamente sobre Obama e, logo de cara, fez um elogio ao político: “Barack Obama é bonito pra caralho! Aliás, eu gosto mais de preto do que de mulher”, disse, referindo-se à candidata derrotada Hillary Clinton. Em comparação ao momento político vivido por norte-americanos e brasileiros, Caetano alfinetou: “Obama está querendo imitar os brasileiros, e muitos brasileiros estão querendo imitar os Estados Unidos pré-Barack Obama”.

O racismo acabou se transformando no mote de todo o show. Apenas com o seu violão, Caetano tocou o clássico “Feitiço da Vila”, de Noel Rosa. Após cantar a música, o compositor baiano analisou cada verso da canção, mostrando um certo cunho racista em sua letra, como nos versos: “Lá, em Vila Isabel / Quem é bacharel / Não tem medo de bamba”. Caetano fez questão de cantar a letra completa da canção, que pouca gente conhece, e enfatiza a eterna briga de Noel Rosa com o compositor Wilson Batista.

Mas como a essência da turnê é mostrar as canções novas, e que provavelmente estarão presentes em seu próximo álbum, Caetano apresentou uma meia dúzia delas. Se o título do novo trabalho for “Transamba” mesmo, o ouvinte vai ter que fazer um belo esforço para descobrir aonde se encontra o samba. Tirando a participação especial de Teresa Cristina que cantou canções antigas de Caetano, como “Gema” e “Nu Com a Minha Música” (além da bela “Coração Vulgar”, de Paulinho da Viola), quase nada de samba pôde ser ouvido neste “Obra Em Progresso”. Talvez o que tenha chegado mais perto tenha sido a versão já conhecida de “Desde Que o Samba É Samba” (igual a do CD “Cê – Multishow Ao Vivo”) e “Incompatibilidade de Gênios”, sucesso de João Bosco e que Caetano, com muita propriedade, transformou em uma espécie de “samba indie”.

As canções novas, na verdade, seguiram o mesmo espírito das do disco “Cê”. Só que muito mais difíceis de digerir, diga-se de passagem. Para quem achou “Cê” um disco “difícil”, vai se surpreender mais ainda com (o provável) “Transamba”. Canções como “Falso Leblon”, “Perdeu”, “Tarado” e “Base de Guantánamo” (cujo verso inicial – “O fato de os americanos desrespeitarem os direitos humanos em solo cubano é por forte demais simbolicamente para eu não me abalar” – é capaz de dar um nó na cabeça do ouvinte desatento) são sombrias, difíceis e complexas, o que pode causar o estranhamento de muita gente. Fazendo uma rasa comparação com o Los Hermanos, ficou a impressão que se o “Cê” foi o “Ventura” de Caetano, “Transamba” será o “4”. Sintomático que as canções do “Cê” executadas no show (“Homem”, “Odeio”) tenham sido recebidas pela platéia como velhos sucessos.

Aliás, os tais velhos sucessos foram raros no show. Caetano abriu poucas exceções, todas muito bem recebidas pelo público, como “Sampa”, “O Leãozinho”, “Nosso Estranho Amor” e “Tigresa”. No final, Jorge Mautner e Nelson Jacobina ainda fizeram uma participação especial, com “Todo Errado” e a ótima “Vampiro”, que encerrou a apresentação e fez o público relembrar o show “Eu Não Peço Desculpa”, um dos melhores da carreira do compositor baiano.

Como o título do show já diz, a obra continua em progresso. Seria muito precipitado fazer uma crítica sobre canções que mal (ou ainda nem) foram terminadas – no show do dia 04, Caetano apresentou uma canção que ele tinha acabado de escrever naquela mesma tarde. Se as canções pareceram um pouco estranhas, pode ser apenas questão de costume. Na estréia do show “Cê”, as reações também foram muito dissonantes. E aquelas canções que pareciam tão estranhas naquele momento, hoje são cantadas em coro pelo público.

O melhor mesmo é deixar a obra progredir. Levando-se em conta o que Caetano Veloso está produzindo nos últimos anos, quando a obra estiver terminada, existe grande chance de se transformar em algo maior do que já foi feito em “Cê”, que, em menos de dois anos, transformou-se em um disco clássico da Música Popular Brasileira.

Abaixo, um vídeo amador da canção “Base de Guantánamo”.

3 comentários:

Anônimo disse...

Caro Luiz,

Acho que a jaqueta do Caetano JEANS furou , pois ele está usando uma nova, já era tempo, vai ver que ele ganhou um dinheirinho com aquele cd doidão do CÊ , se voce falou que no show está mais difícil de digerir , antes de ir para o show vou passar na farmácia comprar 100 envelopes de sonrisal e tomar umas pois deve ser barra.

Parabéns pelo Blog/Site continua muito bem escrito e atualizado.

JR

Unknown disse...

Gostei da crítica, confere o site, achei bem legal também, dá pra ver certinho...

http://www.obraemprogresso.com.br/

Beijos!

Unknown disse...

Eita... não sei se agora vai, mas queria falar que gostei muito da crítica. Já conferiram o site? Vale a pena... http://www.obraemprogresso.com.br/


Bjos pessoal!