6 de jun. de 2008

BOSSA PARA GRINGO OUVIR

Sergio Mendes andou meio sumidão por um bom tempo. Quando reapareceu, com o disco “Timeless”, lançado em 2006, reencontrou o sucesso novamente, e como de costume, ele acabou sendo maior nos Estados Unidos. A verdade é que Sergio sempre teve o seu lado bastante americanizado, e alguns fatores na carreira de Mendes são cruciais para que se entenda aonde ele chegou. A mudança para os Estados Unidos no início dos anos 60, a troca de influências com jazzistas como Herbie Mann e Cannonball Adderley, a composição de tema para as Olimpíadas de Los Angeles, tudo isso pode servir como justificativa para “Encanto”, novo trabalho de Sergio Mendes, que está chegando agora às lojas.

“Encanto” é tipo aqueles shows de mulatas na churrascaria Plataforma e que os gringos adoram assistir, provavelmente imaginando que as mulheres mais lindas do Brasil estão ali. Sergio Mendes faz mais ou menos isso em seu novo trabalho. Mistura canções de Jobim e Donato com participações de Will.I.Am, Natalie Cole, Jovanotti e Fergie e faz tudo o que os americanos gostam de ouvir: a mistura da bossa nova – nos Estados Unidos, é “cool” gostar de bossa nova – com a modernidade da produção musical norte-americana, principalmente no que tange à dance-music e ao hip-hop, coisa que, aliás, Will.I.Am faz muito bem.

Os americanos provavelmente devem achar que “Encanto” é o supra-sumo da música brasileira moderna. Mas não! “Encanto” é sim a tradicional música brasileira unida à música norte-americana produzida atualmente (leia-se: dance, rap, hip-hop, eletrônica etc.). O único detalhe é que a música brasileira criada no final dos anos 50 e que faz sucesso no mundo todo até hoje (leia-se, bossa-nova), por ser atemporal, sempre vai ser considerada moderna.

Para o brasileiro que gosta da bossa tradicional, com as suas típicas batidas de violão e bateria (aquelas criadas por João Gilberto e Milton Banana), o novo trabalho de Mendes é uma miscelânea que pode soar até cafona. Tudo bem que, desde os tempos do grupo Brasil’65, Mendes sempre flertou com a americanização da música brasileira – até o acento agudo de seu nome foi retirado após o lançamento do primeiro disco –, mas “Encanto” passou um pouco do limite, como provam as versões em inglês (com participação de Ledise) e em francês (com Zap Mama), de “Águas de Março”.

Aliás, com referência às participações especiais, “Encanto” segue o mesmo trilho de “Timeless”. Se no álbum anterior, foi a vez de Justin Timberlake, Black-Eyed Peas e John Legend, agora entram em campo outros nomes que já foram citados acima. Uma coincidência é que todos os artistas que participam dos discos de Sergio Mendes são exatamente os que estão “na moda”. Surpreendentemente, o Timbaland não participou de “Encanto”.

Apesar dos pesares, “Encanto” tem os seus bons momentos, como a afro “Odo-Ya”, em dueto com Carlinhos Brown e “E Vamos Lá” (lá pelo meio do CD tem a versão em espanhol (?!?), “Y Vamos Ya”, em dueto com João Donato), cujo refrão, diga-se de passagem, é bem parecido com o de “Januária”, canção composta por Chico Buarque, no início de sua carreira.
De resto, é inegável que é sempre um imenso prazer ouvir o piano Fender Rhodes 1973 de Sergio Mendes. Mas não é o suficiente.

Abaixo, a faixa “Água de Beber”, com a participação de Will.I.Am.

Cotação: **1/2

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