21 de jul. de 2010

Tarde ensolarada no parque com Rufus Wainwright

De volta, pessoal.
Acabo de chegar do show do Rufus Wainwright aqui em Nova York. Logo que entrei no Propect Park, no Brooklin, eu estranhei que não havia nenhuma advertência no sentido “no claps, please”, como tem sido comum nessa atual turnê, no qual ele apresenta as músicas de “All days are nights: Songs for Lulu”, um tipo de álbum tão deprê que a gente tem vontade de dar um tiro na cabeça.
Mas a proposta desse show é outra: um bando de americano de bermuda querendo curtir um final de tarde no parque com boa música. E esse festival no parque do Brooklin é uma boa pedida, tanto que já está na sua 32ª edição. E sabe quem vai tocar na semana que vem? The National e Dead Weather.

E o show de Rufus no Prospect Park foi diferente mesmo. Ao invés do disco novo completo na primeira parte, e os sucessos na segunda, Rufus misturou tudo, fez piadas, e todo mundo gostou. Apenas Rufus e o piano. E bastou.
Para começar, subiu ao palco o seu pai, Loudon Wainwright III. Ele faz aquele estilão “trovador solitário” com uma-piadinha-para-americano-rir-em-cada-verso. Legal, mas os 50 minutos de apresentação deram no saco.
Mas logo logo o show do Rufus começou. Com o palco decorado com pequenas velas artificiais, ele mostrou logo que estava de bom humor. “A última vez que estive em um parque, poderia ter ficado grávido, mas acabei descobrindo que era gay”, disse, fazendo troça com o episódio que ocorrera com ele, quando tinha 14 anos e fora estuprado no Hyde Park, em Londres. Ele ainda explicou que o “show oficial” da nova turnê acontecerá no dia 29 de dezembro, no “austero” (palavras dele) Carnegie Hall. “Um show perfeito para o feriado de Natal”, brincou. Esse no parque seria um “summer show”. E nada mais apropriado do que começar o show com a bela faixa de abertura de “All days are nights”, “Who are you New York?”, que cita o Empire State, o Madison Square Garden e a Central Station na mesma letra. Aliás, foi interessante ouvir as pesadas canções desse disco envolto a um silêncio sepulcral da plateia, com o barulho apenas das crianças brincando no parque, ao fundo. Show de contrastes.

Em outros momentos, era o barulho dos pássaros que fazia o fundo musical. Em um deles, Rufus recitou o soneto 20, de Sheakespeare. Sabe-se lá porque, ele caiu na gargalhada no final.
Mas o público ficou animado mesmo quando ele disse: “I’m gonna judyciate”, uma piadinha que foi a deixa para ele chamar um pianista (que me escapou o nome) para interpretar algumas músicas de seu projeto dedicado a Judy Garland. O pessoal gostou. E a primeira do repertório de Judy foi “If love were all”. Depois, “That’s entertainment”, “Zing! Went the strings of my heart” e “Do it again”, música que Rufus classificou como a sua favorita do projeto Judy Garland.


Ele também cantou com o seu pai. “Não parece o meu filho?”, brincou Rufus. Cantaram juntos a divertida “Down where the drunkards roll”, de Richard Thompson, compositor amigo da família. Aplausos respeitosos para o pai e aplausos quase histéricos para “The art teacher”. E silêncio respeitoso para “Zebulon”, a faixa mais barra pesada de “All days are nights”: “My mother’s in hospital, my sister’s at the opera/ I’m in love, but let’s not talk about it/ There’s so much to tell you”. E mais um contraste com “Cigarettes and chocolate milk”. Show quase bipolar.
Pausa para o bis, que teve mais 30 minutos de música. A partir daí, ele jogou pra galera. “Poses”, “The man that got away” (mais uma do projeto da Judy Garland) e “I’m a one man” (com o pai novamente) deixaram o show em alta astral até Rufus falar da mãe, que morreu em janeiro passado, de câncer. Mas a ironia apareceu logo em seguida, quando ele apresentou uma canção escrita pela sua mãe que fala da “bonita relação de seu filho com o pai”. Não consegui descobrir o nome da música, mas ela diz algo como “alguém ainda está de pé, já parou de me bater?”.



Para terminar, com a galera já de pé, “Going to a town” e o delicioso medley com canções do projeto Judy Garland: “You made me love you/ For me and my gal/ The trolley song”. A tarde no parque já não era tarde. Já era noite escura, quase onze da noite. Mas as crianças ainda brincavam. E o piano e a voz tão peculiar de Rufus Wainwright ainda soavam no Prospect Park. E quer saber? Foi bem divertido. Mesmo com músicas tristes, deprês, ele consegue rir da sua própria desgraça.


PS. Crédito das fotos: @gabisiciliano